quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Retrato do Desconhecido

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Ele tinha uns ombros estreitos, e a sua voz era tímida, 
Voz de um homem perdido no mundo, 
Voz de quem foi abandonado pelas esperanças, 
Voz que não manda nunca, 
Voz que não pergunta, 
Voz que não chama,  
Voz de obediência e de resposta, 
Voz de queixa, nascida das amarguras íntimas, 
Dos sonhos desfeitos e das pobrezas escondidas. 
  Há vozes que aclaram o ser, 
Macias ou ásperas, vozes de paixão e de domínio, 
Vozes de sonho, de maldição e de doçura. 
Os ombros eram estreitos, 
Ombros humildes que não conhecem as horas de fogo do 
amor inconfundível, 
 
Ombros de quem não sabe caminhar, 
Ombros de quem não desdenha nem luta, 
Ombros de pobre, de quem se esconde, 
Ombros tristes como os cabelos de uma criança morta, 
Ombros sem sol, sem força, ombros tímidos, 
De quem teme a estrada e o destino 
De quem não triunfará na luta inútil do mundo: 
Ombros nascidos para o descanso das tábuas de um caixão,  
Ombros de quem é sempre um Desconhecido, 
De quem não tem casa, nem Natal, nem festas; 
Ombros de reza de condenado, 
E de quem ama, na tristeza, a sombra das madrugadas;  
Ombros cuja contemplação provoca as últimas lágrimas. 
 
Os seus pés e as suas mãos acompanhavam os ombros  
num mesmo ritmo. 
Mãos sem luz, mãos que levam à boca o alimento  
sem substância, 
Mãos acostumadas aos trabalhos indolentes, 
Mãos sem alegria e sem o martírio do trabalho. 
Mãos que nunca afagaram uma criança, 
Mãos que nunca semearam, 
Mãos que não colheram uma flor. 
Os pés, iguais às mãos 
— Pés sem energia e sem direção, 
Pés de indeciso, pés que procuram as sombras e o esquecimento,  
Pés que não brincaram, pés que não correram. 
 
No entanto os olhos eram olhos diferentes. 
Não direi, não terei a delicadeza precisa na expressão  
para traduzir o seu olhar. 
Não saberei dizer da doçura e da infância daqueles olhos,  
Em que havia hinos matinais e uma inocência, uma tranqüilidade,  
um repouso de mãos maternas. 
 
Não poderei descrever aquele olhar,  
Em que a Poesia estava dormindo, 
Em que a inocência se confundia com a santidade. 
Não poderei dizer a música daquele olhar que me surpreendeu um dia, 
 
Que se abriram diante de mim como um abrigo, 
E que me trouxe de repente os dias mortos, 
Em que me descobri como outrora, 
Livre e limpo, como no princípio do mundo, 
Envolvido na suavidade dos primeiros balanços, 
Sentindo o perfume e o canto das horas primeiras! 
Não direi do seu olhar! 
 
Não direi do seu olhar! 
Não direi da sua expressão de repouso! 
Ainda não sei se era dele esse olhar, 
Ou se nasceu de mim mesmo, num rápido instante de paz 
e de libertação!  

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

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Harry,

Eu não te quero aqui.
Quantas mil vezes vou ter que repetir?
Eu te pergunto pra quê você por perto?
Pra me impedir de passar a "Noite na Taverna" ?
Não me venha com suas ideologias; não me pergunte "Que país é este?".
Eu vou continuar erguendo meu "Estandarte Auriverde".
Estou cansada de você, aquela noite foi "A Gota D'água".
Agora estou refazendo a vida, estou a procura d' "O bem-amado."Quero sentir "O coração disparado". E que seja "O bom crioulo", que viva bem comigo até aqui n' "O cortiço".
Não exijo nada mais que "Bagatelas" e "Alguma Poesia". Quero algo pra mim como "A mão e a luva". "O Estrangeiro" já não me encanta mais.
Quero viver o "Carnaval" o resto do ano; e pode dizer que tudo isso são "Idéias de Jeca Tatu", sabe lá, você, o que é isto ?
Aqui tudo é muito bonito.
Aqui as coisas não precisam de você. E você não vai entender.
"Deixa estar", eu cá com "Os Sertões" contemplando "Lampião". Você não sabe a beleza que há.
Não venha; não há necessidade de você aqui.
Já não basta "A Bagaceira" que estão fazendo com nossa "Tenda dos Milagres ?
Eu sei das suas intenções, por favor, não volte. E nem pense em me levar com você.
"Eu" quero passar aqui todos os "Dias e Noites" a ouvir "Várias Histórias", histórias da minha gente, do nosso folclore, histórias que nós entendemos, "Histórias Brasileiras".
Que fique você com as "Americanas" que virão, onde "Toda nudez será castigada".
Eu não as quero nem por "Cinco Minutos".
Não conte com sua "Moreninha" (que de sua não tem nada) "Para viver um grande amor", senhor Potter. Já é "Tarde".
Não me apareça "Nunca Mais".




Autores e obras citadas:

Álvares de Azevedo( Noite na Taverna), Mário Quintana (Que país é este?), Fagundes Varela (estandarte Auriverde), Chico Buarque de Holanda (A gota d'água), Dias Gomes (O bem amado), Adélia Prado (O coração disparado), Adolfo Caminha (O bom crioulo), Aluísio de Azevedo (O cortiço), Lima Barreto (Bagatelas), Carlos Drummond de Andrade (Alguma Poesia), Machado de Assis (A mão e a luva, Americanas e Várias histórias), Plínio Salgado (O estrangeiro), Manuel Bandeira (Carnaval), Monteiro Lobato (Idéias de Jeca Tatu), Cassiano Ricardo (Deixa Estar), Graciliano Ramos (Vidas Secas), Rachel de Queiróz (Lampião), José Américo de Almeida (A Bagaceira), Jorge Amado (Tenda dos milagres), Augusto dos Anjos (Eu), Tobias Barreto ( Dias e Noites), Visconde de Taunay (Histórias Brasileiras), Nelson Rodrigues (Toda nudez será castigada), José de Alencar (Cinco Minutos), Joaquim Manuel de Macedo (A moreninha), Vinícius de Moraes (Para viver um grande amor), Olavo Bilac (Tarde), Cecília Meirelles (Nunca Mais)

quarta-feira, 30 de maio de 2012

MICHIGAN LAKE

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O QUE QUIS O “DESTINO” AO DECIDIR QUE EU NASCESSE PRETA NA BRIGADEIRO ?

POR QUE, CARGAS D’ÁGUA, AOS 8 SOFRI TAL TRAGÉDIA, EM DEZEMBRO E NÃO EM JANEIRO?

ME APAIXONAR PELA PRIMEIRA VEZ POR UM COMPOSITOR BAIANO ESTAVA EM MEU MAPA ASTRAL?

COMO ESCOLHERAM POR MIM QUE ANTES DE CONHECER CHICAGO EU DEVERIA CONHECER NATAL?

O CASAMENTO, ENTÃO, FOI DESEJO DE DOIS OU DE UMA SOCIEDADE INTEIRA QUE DISSE SIM?

QUÃO TRISTE É, ATÉ AOS 33, NÃO TER TIDO NINGUÉM POR NOVE MESESDENTRO DE MIM ?

SE MEU CAMINHO NÃO TIVESSE CRUZADO, HÁ QUATRO ANOS, O SEU, QUEM SERIA HOJE EU?

E A ÚNICA AFIRMAÇÃO É QUE SOU MAIS CHEIA DE MÚSICA, POESIA E DEUS.

E MESMO QUE ESTEJA A MILHAS DAQUI ME RESTARÁ A INSPIRAÇÃO QUE ME TROUXE OS OLHOS TEUS.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Gaiji

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Um pacote sem distintivo
Pacote, não, embrulho, adornado
Cheio de fita, laço, significativo
Perfumado e com flores decorado

Surpreendentemente, entregue em mãos
Encabulada, o recebí, certa noite
Não esperava e fui pega de supetão
Como algo que chega, de repente como a morte

Mas, não havia “passagem” alguma
Nem tampouco transformação
Era, certamente, o presente duma
Palpitação de um certo coração

Eu, pequena, furtiva, não conseguia
Permanecer com regalo em mãos
Que de tão pesado, quase me doía
Podia, distraídamente, derrubá-lo ao chão

Quando, apropriadamente, o abrí
Ví seu tão poderoso conteúdo
Sem plantar tal semente, como a colhi?
Sem pestanejar, o devolví com laço e tudo

Passado tanto tempo, sei
Que o pesado conteúdo não era de cimento
Era algo que não pude ter comigo, tentei
Era o teu, que devolvi junto com meu sentimento

sábado, 3 de março de 2012

A pedra no caminho de Drummond, por Lygia Fagundes Telles

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“- Li o livro do Carlos Drummond – ele disse. E prosseguiu com uma careta: – Horrível! Então aquilo é poesia? Eu também sou moderno, gosto dos modernos, mas assim também é demais!
- Pela primeira vez ouvi hoje alguns versos dele. Gostei muito! – confessei.
- É impossível que você tenha gostado! – retorquiu o poeta. – Ouça só esta maravilha que tive a paciência de decorar… (…) – Começou:
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
(…) Calou-se e ficou a me olhar ansiosamente. Dei uma risada:
- Não acho horrível coisa nenhuma! Acho gozado – exclamei.
O moço da gravata-borboleta tirou então do bolso alguns versos que compusera.
Leu-os. E depois disse:
- Como você acaba de ver, nos meus também não há rima nem métrica. Mas há ideia e ritmo, compreendeu? Ao passo que…
- Sim, eu sei! – interrompi-o, impaciente. Não há como um dia de mau humor para se dizer as verdades todas. Pensei naquele alexandrino e não resisti. Disse-lhe: – Mas o fato é que já esqueci sua poesia. E não esqueci e “nunca me esquecerei desse acontecimento” a que você acaba de se referir.
(…) Fui pela rua com o livro debaixo do braço e pensando em meu exame. A nota era muito baixa e isto era uma coisa aborrecida, apenas aborrecida. Mas inesquecível. Como se fosse uma pedra no sapato. No sapato não, que também era demais. Mas uma pedra no meio do caminho, bem no meio do caminho. Está claro que seria fácil contorná-la. Mas, em redor de mim, fisionomias empedernidas também iam encontrando outras pedras: um encontro desfeito por causa da garoa, uma carta que não chegou no momento desejado, uma vaga que foi preenchida por outro… Pedras, pedras, pedras. Haverá outros encontros, chegarão outras cartas, abri-se-ão muitas outras vagas. Mas a garoa caindo forte justamente naquele momento, e o carteiro passando reto, e aquele sujeito sentado num lugar que quase foi nosso… Não, esses acontecimentos nunca mais serão esquecidos.
Agora eu já não achava essa poesia gozada. Tinha um autêntico gosto de vida e era um gosto bem amargo.”

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

One Minute Puberty

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